quarta-feira, março 29, 2006

O lobo na pele de cordeiro

Bem... 2 meses se passaram e ainda procuro acalmar meu coração e entender esse turbilhão de acontecimentos. Mas aí me mostraram o que é a Mosca Azul. Frei Betto que sempre consegue transcrever as angústias em seus livros. Por isso, vai 2 trechos os quais me fizeram de certa forma entender (mas não compreender) tudo o que estamos vivendo.

A cabeça pensa onde os pés pisam. Como ser de esquerda sem “sujar” os sapatos lá onde o povo vive, luta, sofre, alegra-se e celebra crenças e vitórias? Teoria sem prática é empulhação. Em mais de quarenta anos de militância na esquerda vi debandarem, não apenas para a direita, mas sobretudo à indiferença, companheiros que outrora arrotavam teorias marxistas, apontavam nos colegas desvios e vacilações, acreditavam portadores da chave do templo de Delfos da história. Até que encontravam a chave do cofre de uma boa remuneração salarial, uma função pública confortável, um posto de executivo na iniciativa privada. Disseram adeus às armas e às idéias, às teorias e aos companheiros. Agora, do alto de sua alpina omissão frente à desigualdade social, miram de binóculos a nós, os equivocados, os dinossauros, essa espécie arcaica que insiste em sobreviver á destruição causada pelo meteoro desabado com o Muro de Berlim. Envergonham-se do próprio passado, evitam ferir a boca com a palavra socialismo, tentam se convencer de que fora do mercado livre não há salvação, esse mercado que favorece um terço da humanidade e condena o restante à exclusão social.Como proclamar êxito do capitalismo se quatro bilhões de seres humanos sobrevivem abaixo da linha da pobreza?

Militantes da esquerda mudam de lado ao catar piolho na cabeça de alfinete. Como dizia Jesus, vêem o cisco no olho alheio sem enxergarem o camelo no próprio. Ficam como meros expectadores e juizes e, aos poucos, são cooptados pelo sistema. Não se deixam criticar nem admitem os próprios erros.

(...)

Quem se apega ao poder não suporta críticas, toma-as por ofensas, por minar sua auto imagem e exibir suas contradições nos olhos de outrem. Daí porque se isola, fecha-se num círculo hermético ao qual só têm acesso os que lhe cumprem ordens, dizem amém a suas idéias ou, ainda que críticos, calam-se coniventes, pois nutrem também suas ambições e não querem ser rifados por quem possui mais poder que eles. Assim, cria-s uma cumplicidade tácita. Teme-se apenas a imprensa saber o que se malfaz. Todavia, age-se como se secretárias, copeiros, garçons, motoristas seguranças e empregados não tivessem olhos, cabeças e ouvidos, bocas, parentes, vizinhos e amigos...

(Frei Betto – A mosca azul, reflexão sobre o poder)

Será que dá pra pensar um pouquinho sobre o que está acontecendo agora?

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